E hoje, 11 de setembro, quarenta e sete anos
sem Allende. E já no próximo dia 23, também a mesma estação sem Neruda. E o Chile tem muito para homenagear... A bem da verdade, não
só os chilenos. Todos que admiram e foram contagiados por esses dois homens.
Pablo Neruda, em Confesso que vivi:
"Escrevo essas rápidas linhas para
minhas memórias a apenas três dias dos fatos inqualificáveis que levaram à
morte meu grande companheiro, o presidente Allende. Seu assassinato foi mantido
em silêncio, foi enterrado secretamente, permitiram apenas à viúva acompanhar o
imortal cadáver. A versão dos agressores é que acharam o seu corpo inerte, com
mostras visíveis de suicídio. A versão que foi publicada no exterior é
diferente. Após o bombardeio aéreo vieram os tanques, muitos tanques, para
lutar intrepidamente contra um só homem: o presidente da República do Chile,
Salvador Allende, que os esperava em seu gabinete, sem outra companhia a não
ser seu grande coração envolto em fumaça e chamas.
Não podiam perder uma ocasião tão boa.
Era preciso metralhá-lo porque jamais renunciaria a seu cargo. Aquele cadáver
que foi para a sepultura acompanhado por uma única mulher, que levava em si
mesma toda a dor do mundo, aquela gloriosa figura morta ia crivada e
despedaçada pelas balas das metralhadoras dos soldados do Chile, que outra vez
tinham atraiçoado o Chile."