O
General em seu labirinto narra os últimos dias de Simón Bolívar
Por Alexandre Barbosa
Hoje, ao olhar as bandeiras da
Venezuela, da Colômbia e do Equador um observador pouco atento pode ver as
semelhanças nas listras e não perceber que talvez um dia todas essas nações
possam ter sido uma só. A idéia de unidade latino-americana parece ainda mais
distante ao ler notícias das farpas trocadas entre os presidentes ou sobre as
cíclicas crises que vivem os países da América do Sul.
José Antonio de la Santísima Trinidad
Simón Bolívar y Palacios, o Simón Bolivar (1783-1830), sonhou um dia com uma
nação unida e independente. O General em seu Labirinto, do autor colombiano
Gabriel García Márquez, conta os últimos dias desse sonho e mostra que, apesar
da tuberculose, a verdadeira causa da morte do Libertador foram as mesmas
cegueiras que as elites latino-americanas insistem em manter.
Quem
foi Simón Bolívar
Nascido na aristocracia criolla venezuelana,
Bolívar só se desenvolve como um revolucionário latino-americano a partir de
1795, depois da morte dos pais quando muda para a casa de seu mestre Simón
Rodriguez.
Em 15 de agosto de 1805, depois de
assistir à chegada ao poder de Napoleão, faz o famoso juramento do Monte Sacro
em que promete libertar a América do domínio espanhol. De fato, pelos anos
seguintes todos os esforços são, não só para conquistar a independência, mas
para fazer da América uma só nação. A primeira experiência de guerra foi em 23
de julho de 1811 ainda sob as ordens de Francisco Miranda. Em 24 de dezembro de
1812, Bolívar inicia a campanha do Rio Magdalena, na atual Colômbia, que na época
se chamava Nova Granada. Em 14 de outubro de 1813, depois de uma entrada
triunfal em Caracas, Venezuela, o Conselho de Caracas, em assembléia pública
aclama Bolívar como general e Libertador.
Em 1823, o Peru pede ajuda a Bolívar para auxiliar no processo de independência. Em 1824 são travadas as batalhas finais: 06 de agosto, em Junín; 5 de dezembro, libertação de Lima. No dia 9 de dezembro, Sucre vence a batalha de Ayacucho que marca a liberdade de toda a América espanhola. Bolívar recusa o 1 milhão de pesos oferecido pelo Congresso do Peru mas aceita a mesma quantia que correspondia a seus soldados. Também renuncia à presidência com poderes ilimitados. Em 6 de agosto, a assembléia do Alto Peru decide a criação da República da Bolívia e em 25 de maio de 1826 envia o projeto de constituição boliviana.As lutas seguem na parte setentrional da América do Sul, enquanto que, mais ao sul, o general San Martí também segue na luta pela independência da Argentina e do Chile. Em 17 de dezembro de 1819 cria a república da Colômbia, da qual é eleito presidente.então dividida em três departamentos: Venezuela, Cundinamarca e Quito. Em 16 de junho de 1822, Bolívar faz a entrada triunfal em Quito, ao lado do que ele mesmo considerava seu sucessor, o marechal Sucre. Também em Quito Bolívar conhece Manuela Sáenz, que foi sua grande companheira.
O
fim do sonho da unidade latino-americana
Depois das glórias, as nações
independentes têm de iniciar o processo de construção da república e começa a
agonia de Bolívar. A partir de 1827, as elites de cada nação libertada iniciam
as mesmas discussões vistas hoje, no século XXI. Guerras civis, resistência em
dividir o poder e fazer concessões ao povo, tomada de empréstimos da Inglaterra
e dos EUA. Em 25 de setembro de 1828, Bolívar, que insistia na unidade das
nações, sofre um atentado e é salvo por Manuela Sáenz. Em 8 de maio de 1830,
depois de assistir ao desmembramento dos países, Bolívar sai de Bogotá pelo rio
Magdalena com o intuito de se exilar, já sofrendo com a tuberculose.
É nesta data que começa o livro de
García Márquez. Bolívar está triste com as guerras civis e mais ainda com
corrupção e desleixo com os bens públicos promovidos pelos novos mandatários,
como mostra o seguinte trecho.
"Sábado
ocho de mayo del año treinta, día de la Santísima Virgen, medianera de todas
las gracias", anunció el mayordomo. "Está llovendo desde la tres de
la madrugada"
"Desde
las tres de la madrugada el siglo diecisiete", dijo el general con la voz
todavía perturbada por el aliento acre del insomnio. Y agregó en serio:
"No oí los gallos".
"Aquí no hay gallos", dijo José Palacios".
"No
hay nada", dijo el general. "Es tierra de infieles".
O livro de García Márquez conta os
episódios da viagem pelo Rio Magdalena até a morte do libertador no dia 17 de
dezembro. Feito a partir de documentos recolhidos e cartas de Bolíviar, Márquez
mostra que, depois da independência, as jovens nações latino-americanas
iniciaram um processo cíclico de guerras civis, corrupção e
subserviência às nações européias e à emergente nação
norte-americana.
Simón Bolívar foi hostilizado nos seus últimos dias. Hoje, as nações lhe rendem estátuas e homenagens, mas falharam em apoiar suas idéias num momento crucial, que poderia ter mudado o destino trágico da América Latina nos próximos anos.