O tema desta dissertação dar-se-á em
torno da antropologia de Aristóteles, sua visão organicista da cidade, e a
aplicação de sua teoria ético-política na atualidade, através da análise da possibilidade
de haver Direitos Humanos na Grécia Antiga - é preciso levar em consideração
que se trata de um conjunto de ideias ainda muito imaturas. Apenas
considerações gerais sobre o assunto, a título de preparação de aula.
Segundo Aristóteles, o homem é dotado de
três características essenciais, a saber: é um ser político; dotado de
razão e linguagem; bem como, um ser ético.
O homem é um ser político porque ele
apenas pode realizar-se plenamente na “pólis”. Ao nascer, o ser humano é
carente de tudo, enquanto a cidade é autossuficiente, bastando a si mesma.
Neste sentido, fora da pólis só há lugar para deuses e brutos. Fato que,
por consequência, implica que o ser humano apenas pode alcançar
sua natureza racional dentro da pólis.
Por outro lado, o homem é um ser dotado
de razão e linguagem, porque possui o logos e a capacidade de conferir o certo
e o errado. Desse modo, o homem dispõe da capacidade de comunicar-se - o que,
diferentemente dos outros animais, atribui a ele sua natureza ética, tendo em
vista que, sem ela, ele seria o mais selvagem e pavoroso dos seres. Portanto,
se o logos lhe dá a capacidade de razão e linguagem, esses artifícios devem ser
usados de maneira essencialmente ética.
No âmbito social, segundo Aristóteles,
haveriam duas esferas: o “oikos” e a “pólis”. O oikos representa o domínio
privado das relações humanas, enquanto a pólis representa o domínio público.
Entre o oikos e a pólis, existem diferenças de espécie, quantidade e qualidade. Sendo assim, a pólis ocupa um lugar de “superioridade”, tendo em vista que
ela abrange o indivíduo, de modo que este é apenas uma parte em relação ao
todo, e ocupa uma posição determinada dentro da sociedade.
Portanto, é necessário evidenciar o
caráter organicista da “pólis aristotélica”. Na pólis, cada indivíduo ocupava
um lugar e possuía uma função. Essa estrutura social seguia a ordem
natural do cosmo e, nesse sentido, pode-se dizer que Aristóteles
institucionalizou uma hierarquia natural, em que alguns serviam de instrumento
para a realização plena de outros. É de se notar, entretanto, que essa
explicação naturalista era adequada para a época, tendo em vista que legitimava
a diferenciação entre os cidadãos livres, as mulheres e os escravos.
Portanto, de maneira sucinta, pode-se
afirmar que, de fato, o homem é um ser político, razoável e
ético. Contudo, há de se restringir a concepção de “homem” àqueles
seres humanos do sexo masculino, nascidos de pai e mãe gregos e que, de
qualquer modo, encontravam-se desimpedidos de qualquer ofício, além
da dedicação política à cidade. Esses “homens” adquiriam a qualidade de
cidadãos gregos, qualidade esta que lhes atribuíam diversas
honrarias, bem como o direito ao acesso à justiça, à liberdade e à igualdade
(entre si).
De acordo com esse panorama, é
pertinente questionar a existência de Direitos Humanos na Grécia. Aqui
entende-se Direitos Humanos não em um sentido restrito do termo, tendo em vista
que é de criação moderna, mas em um sentido amplo, que implique em
valores intrínsecos da própria natureza humana.
Desde logo, afastam-se, da questão, os
direitos sociais. Não há como se pensar em direito a moradia, saúde e educação
para todos em uma sociedade cuja desigualdade é estrutural. Os direitos de
igualdade possuem aplicação imediata para uma totalidade, o que não ocorria na
Grécia nem nunca poderia ocorrer, já que a hierarquia natural dava a cada um o
que se merecia, seguindo a ordem do cosmo.
Afastada a existência dos direitos
sociais, cabe agora analisar a possibilidade dos direitos de liberdade, ou
direitos fundamentais de primeira geração. Pode-se, nesse momento, afirmar que
havia uma certa noção de liberdade e igualdade na Grécia Antiga. Entretanto,
essas noções eram aplicadas a uma sociedade elitista, para uma pequena minoria.
Isso significa que elas assumiam um caráter muito mais discriminatório:; eram
verdadeiras regalias, e não direitos.
A impossibilidade de existência de
Direitos Humanos na Grécia Antiga é manifesta, principalmente, pelo fato de
que, se havia algo de natural na “pólis”, esse algo seria a desigualdade, a
hierarquia, e não os direitos e os valores éticos implícitos.
Portanto, conclui-se que a sociedade
política prevista por Aristóteles não pode servir de fundamento ético para os
Direitos Humanos (com algumas exceções, como a releitura do significado de
“endoxa” ). Ainda que se tente reproduzir a ideia de que o ser humano apenas se
realiza na pólis (comunitaristas), de modo algum essa plenitude trará consigo a
instrumentalização estrutural de outros seres humanos, como se dava em
Aristóteles.